sexta-feira, 27 de abril de 2012



O Homem
Um certo dia um homem esteve aqui

Tinha o olhar mais belo que já existiu

Tinha no cantar uma oração.

E no falar a mais linda canção que já se ouviu.

Sua voz falava só de amor

Todo gesto seu era de amor

E paz, Ele trazia no coração.

Ele pelos campos caminhou

Subiu as montanhas e falou do amor maior.

Fez a luz brilhar na escuridão

O sol nascer em cada coração que compreendeu

Que além da vida que se tem

Existe uma outra vida além e assim...

O renascer, morrer não é o fim.

Tudo que aqui Ele deixou

Não passou e vai sempre existir

Flores nos lugares que pisou

E o caminho certo pra seguir

Eu sei que Ele um dia vai voltar

E nos mesmos campos procurar o que plantou.

E colher o que de bom nasceu

Chorar pela semente que morreu sem florescer.

Mas ainda há tempo de plantar

Fazer dentro de si a flor do bem crescer

Pra Lhe entregar

Quando Ele aqui chegar

Tudo que aqui Ele deixou

Não passou e vai sempre existir

Flores nos lugares que pisou

E o caminho certo pra seguir

Tudo que aqui Ele deixou

Não passou e vai sempre existir

Flores nos lugares que pisou

E o caminho certo pra seguir


quarta-feira, 25 de abril de 2012



E a estrada me chama,
eu vou indo, ouvindo os pássaros,
o som das cigarras.
Sinto o cheiro do mato, da bosta do gado,
do rio que corre
Quando chega a noite, deitado na grama,
ao redor da fogueira pequena,
eu olhando estrelas fico em silêncio,
Sou amante e amo, ao meu modo,
o que me cerca e o que está em mim,


assim, guardado.

sábado, 21 de abril de 2012



A Filha Única da Vizinha.
Teddy Williams

Depois de alguns meses de viagens resolvi visitar meus pais. Aproveitaria para curtir as férias. O apartamento ficava a uns quinze minutos da praia, com três quartos espaçosos, banheiros, varanda e jardim. Eu tinha chegado do Pará e queria fazer uma surpresa. Soube pela vizinha, quando ela saia do apartamento ao lado, que todos estavam viajando: minha irmã, meus pais e só voltariam no fim da semana. Agradeci. Como tinha as chaves, fui entrando e ligando para meu pai. Fazia uns meses que eu não os via. Só tinha falado com minha mãe, ao telefone, ainda quando estava na estrada, voltando para o Ceará.

Ao celular, minha mãe muito animada, disse que voltaria do passeio que mal começara. Eu pedi que todos aproveitassem, pois ficaria até eles voltarem. Meu pai falou que no domingo estariam de volta - tinha cervejas e comida na geladeira. Resolvi que iria descansar: beber, deitar e curtir uns filmes antes de ir à praia.

Confortavelmente instalado em uma rede, assistindo a um filme chamado Tango, ouço a campanhinha tocar. Ao abri-la, reencontro a filha da vizinha, uma linda menina-mulher, de short jeans, blusa branca e sandálias havaianas. Sorriu e perguntou se podia entrar. Claro, dei passagem para aquela bela surpresa! Ainda em pé, ela pergunta assim, suavemente, com o olhar tímido:

- Eu estou precisando saber de uma coisa, você pode me ajudar?
- Se eu souber, ajudarei com prazer – convidei-a para sentar-se e fechei a porta.
- É que... acabei de assistir a uma reportagem sobre... Gravidez na Adolescência e precisava tirar uma dúvida: se a camisinha é um tamanho único ou tem diferentes tamanhos? Se a Pílula do Dia Seguinte tem contra-indicações? – perguntou assim, na lata.
- Calma! Devagar! – respondi. Pelo pouco que eu sei, existe uma medida padrão, mas eu já vi algumas camisinhas tipo extra, tamanha maior. Por que a dúvida? – perguntei para ver o que ela queria saber na realidade.
- As meninas na faculdade estavam com algumas. Elas falaram que já tinham passado maior sufoco com os namorados, pois as camisinhas tinham estourado devido ao tamanho do... você sabe? – dos meninos, ficantes e namorados.
- Às vezes até pode rasgar, estourar. Talvez pelo jeito de colocar, que precisa seguir alguns cuidados, antes da transa. O tamanho nem sempre é o motivo de estourar.
- Como assim, alguns cuidados? – ela perguntou já olhando nos meus olhos atenciosa, sem quase piscar.
- Você nunca abriu uma camisinha? Tem transado sem? Está grávida?
- Já vi, mas abrir mesmo, não! Nunca precisei. Você tem alguma para me mostrar como se abre? – ela perguntou sorrindo e não respondendo as minhas perguntas, indiscretas.

Lilian já tinha feito 19 anos. Estava no segundo ano da faculdade de Nutrição. Era filha única, de um casal de amigos de meus pais e muito tímida. Porém, o que tinha de timidez ela ia desenvolvendo de inteligência: dessas de ter muita curiosidade, prestar atenção no que as pessoas falam. Respeita as ideias diferentes das suas e também possui boa memória - quando sabemos usá-la é maravilhoso. Era muito educada e elabora bem as perguntas, assim consegue obter respostas sem embaraçar as pessoas com as quais conversa, no geral.

Rápido busquei umas camisinhas na mochila e lhe mostrei: sabor tuti fruti, hortelã, morango – aromas que ela sentiu logo que as pegou.
- Preste bastante atenção antes de abrir. Fui falando e lhe entregando uma camisinha.
- Tem vários sabores! Eu vi uma que era de chocolate, o sabor todinho, dava até vontade de comer.
- É sim, algumas são aromatizadas: morango, hortelã, canela, chocolate, tuti fruti e etc. Abra devagar e sinta a textura, o lubrificante, o cheiro.
- Como eu abro? Você disse que tem um jeito certo...
- Não é a questão de um jeito certo. É só para evitar que se fure ou rasgue ao abrir, o que às vezes pode acontecer e ninguém perceber. Unhas grandes, os dentes muito fortes, nunca usar outras coisas. Deixa eu te mostrar. Nas pontas nós forçamos para rasgar e abrir a embalagem ou então nos picotes, assim forçamos com os dedos.
- Mas parece ser tão fácil, do jeito que você abre. Deixa-me ver?
- Claro, mantenha ela assim presa na ponta. – disse passando a camisinha para ela, já fora da embalagem.
- E ela se estica, fica bem grande? Como aquelas bolas que já vi em muitos shows, voando para lá e para cá?
- É! Uma péssima utilização das camisinhas, mas fazer o quê?
- Sim e ai? Como ela é colocada? Quais são os cuidados mesmos? Por que elas rasgam?
- É uma entrevista para uma pesquisa? Vamos por parte... Primeiro é preciso algo para lhe demonstrar como colocá-la. Vá até a cozinha e pegue uma banana, não muito madura ou uma cenoura, média, se não tiver eu pego uma caneta mesmo.
- Caneta, banana, cenoura? Tá certo! Vou ver na cozinha, volto já.


Ela já conhece a casa, pois sempre vem conversar com minha irmã. Seus pais são muito amigos dos meus, tomam café e até almoçam juntos, quando podem. Eu é que vivo no mundo viajando e quase não os visito e quando venho, tenho a sorte de encontrá-los passeando. Meus pais se dão muito bem com os vizinhos, já moram há muitos anos no bairro.

As escolas deveriam ter aulas de Educação Sexual para ajudar na formação dos jovens e também dos pais. Teríamos mais pessoas transando porque desejam transar e não porque foram “iludidas/enganadas”. É complicado ver adolescentes em uma maturidade sexual não saberem o que fazer para terem um relacionamento “seguro” ou até não o terem, se assim escolherem, mas falta de informação é “foda”, ou melhor não é foda, é um desastre.

Ela voltou com duas bananas na mão e a camisinha na outra.
- Estão aqui, suas bananas e vamos continuar a nossa aula.
- Minhas bananas não! As bananas. E não é aula, estou apenas respondendo as suas curiosidades, que um dia eu também as tive. Pronto, o que você acha que deve ser feito com a camisinha e a banana?
- Isso é fácil, enfiar a camisinha na banana!
- Então vá lá, coloque a camisinha. Lembre-se que será usada em uma relação sexual. Ou melhor, a camisinha será colocada no pênis do seu parceiro antes da relação sexual, no auge do bem bom.

Ela sorriu e foi tentando colocar a camisinha, evitando deixar a banana cair, colocou no sofá e com as duas mãos foi descendo a camisinha na banana.
- Parabéns, já é um bom começo para quem disse nada saber sobre camisinhas.
- Obrigada, foi meio chato ter que segurar a camisinha e a banana, ela fica deslizando.
- Algumas coisas você deverá ter em mente: normalmente quem coloca a camisinha, em princípio, será seu parceiro, afinal para ele será mais prático, mas você também deve ter a sua guardada para quando precisar. Segundo, sempre é importante apertar na parte de cima, aqui onde parece um biquinho, pois é onde ficará o líquido, chamado esperma depois da transa, se seu parceiro não apertar poderá criar uma bolha de ar na hora de por a camisinha e pode fazer o esperma sair e escorrer antes de ser tirada no ato sexual. Também existem camisinhas femininas, mas isso eu não tenho aqui em casa.
- E depois é transar muito e está seguro de tudo?
- Não é assim não! Vai depender de muitas outras coisas.
- Caramba, é mais difícil do que prova de matemática e física no mesmo dia.
- É importante vocês conversarem antes de transar, o que normalmente é complicado, por causa da emoção, dos desejos, tesão. Mas seria importante, assim os dois podem se auxiliar, sei que é difícil, mas não deixe de tentar.
- Para você é fácil dizer, já comeu muita gente por ai, pensa que eu não sei?
- Muita gente não, só mulheres e as coisas não são assim tão simples como se fala por ai. Ninguém cai do céu na cama da gente e nem sai pedindo “me coma, estou de folga” ou então “estou trabalhando”, quer? Vamos terminar a aulinha para não dar bronca com a sua mãe, já faz tempo que você chegou aqui, para tirar essas dúvidas.
- Sem chance, eles foram com os meus avós até o Iguape. Só voltam mais tarde.
- É uma reunião na praia? Nem me convidaram. Tá bom, então mais tarde falamos mais sobre a camisinha.
- Tá me dispensando? Está esperando alguém?
- Não é nada disso. Não estou esperando ninguém. É que... a carne é fraca e os desejos são fortes. Já ouviu falar nisso?
- Não vejo nenhuma carne fraca aqui, nem a minha e nem a sua. Pelo contrário, vejo que está muito forte ai!
- Menina, não brinque com quem tá quieto ...
- Não quero brincar, quero é fazer. Você se garante ou não?

Não pensei mais, já estávamos com muita teoria e era hora da prática. Nossos beijos foram fortes e demorados. Caímos no sofá, com banana e tudo. Ela estava ofegante, porém sem pressa, fui tentando fazer os segundos serem horas, já que estaríamos sozinhos por muito tempo. Nossas roupas foram atiradas ao chão e aquele olhar de menina inocente me deixava com mais tesão ainda.

Lilian, sempre que podia andava aqui em casa. Minha mãe era professora de inglês e minha irmã, de 17 anos era uma de suas poucas amigas. Às vezes muitas meninas passavam o fim de semana aqui, estudando e aproveitando para pegar uma praia, era uma animação e tanto. Eu queria poder estar aqui por mais tempo, mas como era caminhoneiro, sempre estava na estrada, em uma vida muito difícil. Minha casa era na periferia, em um bairro distante e poucas vezes eu conseguia aparecer para ver a família e já fazia três dias que tinha chegado de uma viagem do Pará, onde fomos entregar umas encomendas em Belém. As estradas estão em péssimo estado, o corpo da gente fica só o caco. Descansar no apê dos meus pais é o melhor que faço às vezes.

Acabamos indo para o quarto em que eu ia dormir. Passamos à tarde juntos, aprendemos na prática como usar as camisinhas. Os pais de Lilian chegaram ao fim da noite de sexta e os meus chegaram domingo no fim de tarde. Fizemos um belo jantar em família e convidados, comemorando todos os nossos aprendizados.

Prazerosos aprendizados!

Cantigas de Amigo - "Ai flores do verde pino!"

Elomar - O Pedido




As lembranças de Minas
Teddy Williams

Seria a sua última viagem, por esse mês. Tudo o que tinha planejado, desde a primeira vez dera certo. Trabalhara bastante, exaustivamente. Poderia pagar suas dívidas e agora era descansar um pouco.
No aeroporto, como de costume, sempre revisava as duas malas antes de embarcar: uma com fita branca na borda seria a sua de mão e a outra, com fita azul, seria a que despacharia.
Resolveu sentar-se para ainda apreciar a vista panorâmica no salão de embarque. Ao longe, avistou uma loja e lembrou-se do queijo de Minas que prometera a sua mãe - a correria foi tanta que quase o ia esquecendo. Levantou-se e dirigiu-se ao balcão, onde foi atendido por uma senhora com lindo sorriso.
- Pois não, poço ajudá-lo?
- Claro! Preciso de uma peça de queijo do Serro, redondo e pesando aproximadamente um quilo – não queria ter excesso na bagagem.
Ela lhe mostrou o queijo. Ele confirmou e disse:
- É para presente, por favor! Lembranças para minha mãe.
Recebeu-o bem embrulhado em papel bonito. Pagou, agradeceu e saiu!
Lembrou-se que o embrulho do queijo fora feito em um papel parecido com o das encomendas que já trazia em sua bagagem de mão.
Cuidadosamente guardou-o e foi esperar o chamado para o embarque.
Logo que autorizaram, ele dirigiu-se a fila, que não era grande. Fazia dezoito dias que estava distante da esposa e muitos meses sem ver os pais, a saudade era grande.
A esposa, jovem e também independente, já tinha decidido que do aeroporto mesmo embarcariam para sua primeira semana de viagem a Maceió, somente os dois. Esperavam por ele no aeroporto, ela, seu irmão e sua mãe, que a levaram para o embarque junto com as suas cinco malas cor de rosa e os pais dele, sentados um pouco distantes, que foram em carro próprio, desejar boa viagem ao filho.
Aline, a esposa, era apaixonada por todos os doces que ele lhe trazia das viagens: geléias de pimenta, doce de leite, balas de caramelo, mamão com coco, amoras, figo e especialmente o que ele estava levando, mesclado de chocolate com leite, da região de Araxá em Minas Gerais, “uma dilííícia”, era o que sempre ela dizia.
A mãe, a quem ele fazia mais agrados do que a esposa, nascida em Minas, fazia tempo que não ia a sua cidade natal. Recomendara-lhe queijo para matar desejos e recordações, caso ele passasse pelo aeroporto daquele estado. Também trazia lembranças para os sogros. Estava levando geléia de mocotó e garrafinhas de cachaça, escolha da própria sogra, que desejava fazer uma surpresa ao marido, marinheiro de muitas viagens.
A tranqüilidade do voo fez com que ele sonhasse em um dia ter reunidos em uma mesma viagem, seus pais, sua esposa e seus sogros. Algo que não vinha sendo fácil nos últimos meses.
O piloto informa da proximidade à Fortaleza: clima bom, temperatura agradável e obrigado por escolherem a nossa companhia!
O avião aterrizou. Bagagem na mão, agora é rever a família e viajar novamente. Uma loucura, mas para não desagradar a esposa, já que as férias não coincidiram, concordou em terem esses sete maravilhosos dias juntos, ele pensou sorrido.
Com suas malas dentro do carrinho saiu para o reencontro de todos.
A alegria foi imensa. Os pais choravam, pois já não viam o filho há mais de quatro meses, por causa das viagens. A sogra também em lágrimas, pois sua filha começou a chorar, já sentindo imensas saudades da família, da qual nunca se separara, mesmo após o casamento, pois a lua de mel foi na própria cidade.
Depois de alguns abraços, beijos e notícias de Minas e do Rio entregou os presentes que trouxera. Observou que todos eram em sacolas quase parecidas. Cansado, não quis se certificar dos presentes que estava distribuindo. A sogra pegou o seu e consolando a filha guardou-o sem olhar seu conteúdo. Os pais, desejando boa viagem ao casal e lembrando que eles ainda precisavam fazer o check in, também guardaram o que receberam com sorrisos e agradecimentos. Para a esposa, disse que o entregaria na segunda lua de mel.
Check in feito, agora rumo à sala de embarque. Passaram pelo raio x e o vôo já estava liberado.
Ela, feliz pela viagem que estava fazendo, só queria chegar logo para poder aproveitar a companhia do marido. Ele, cansado, também feliz pela primeira viagem fora do estado com a esposa, precisava dormir um pouco melhor, depois de tantos dias trabalhando.

No hotel cinco estrelas, tudo escolhido por ela, depois de três horas de viagem, adormeceram. Amanheceram felizes. Beijos! Abraços! Bom dia! Ela logo desejou ver o presente que ele lhe trouxera.
Ele, ainda sonolento, diz-lhe com carinho para que ela o pegasse na mala da fita branca. Ela o encontra. Abre e logo começa a chorar, reclamando do cheiro desagradável do presente. Ele viu que eram os presentes recomendados pela sogra.
Segundos depois, no seu celular, sua mãe pede notícias da viagem e agradece pelo maravilhoso mesclado de Araxá que recebera. Uma delícia, disse ela, delícia!
No outro canto da cama, ao celular, ela, a esposa, continua chorando e reclamando do cheiro do doce que dessa vez ele lhe trouxera: “parecia cheiro de carne de boi” - e a mãe, sem ouvir a filha reclamava do presente que o genro lhe dera dessa vez: “um quilo de queijo branco e ainda mais sem sal, um horror!”.
Ele voltou a dormir e sonhou em como seria bom se todos estivessem juntos e ele pudesse trocar os presentes, experimentar um pouco de cada lembrança que trouxera e contar sobre suas viagens. Nada mais, além disso.

quinta-feira, 19 de abril de 2012









Teddy Williams


Meu amigo Elias de França e família.

Quando saio de Fortaleza em direção ao sertão, em especial a cidade de Crateús, dando umas voltas também as cidades de Nova Russas e Hidrolândia, um novo mundo se apresenta e tudo se transforma. Até chegar, algumas longas horas de estrada, de ônibus ou carro.

Chegando lá, a vida se modifica de fato. O tempo e as pessoas ainda correm menos, mesmo diante da correria da globalização, da explotação do homem pelo homem e de outras injustiças sociais.

Vou me situando com as novidades do dia, da semana, do mês. Vou vivendo uma nova vida, ligada a que tenho de caminheiro, com outros olhares e outras estradas, amigos por esse nosso Brasil. Mas lá existe uma transformação também. Quando chega o fim de semana, as histórias continuam, com outros ares, sabores, luzes, olhares e lugares.

Em alguns passeios, depois de minutos na estrada, chegamos ao Arvoredo. Lá, dependendo da hora e do dia, geralmente antes do almoço, uma especialidade diferente a mesa. Sabores da terra, preparados por mãos amorosas, felizes em compartilhar, uma característica real do sertão. O alimento é criado e/ou cultivado na própria casa, sem venenos e outras coisas nocivas a nossas vidas.

Alguns minutos depois, mais felizes ainda, vamos as redes, cadeiras e até no chão... um cafezinho e uma boa conversa, quem sabe até uns cochilos. Eu durmo e ronco....fazer o quê?

No antigamente, em meu tempo de cervejas e/ou vinho, uma bebida para refrescar e ficar na rede real. Curtir o alpendre da casa e viver uma outra vida, menos louca, menos agitada, mais cheia de luz.

São muitas poesias para se viver e histórias para se escrever, pois é também uma terra de muitas realizações e acontecimentos.

Abraços a todos!

quarta-feira, 18 de abril de 2012


Meninos
Juraildes da Cruz

Vou pro campo, no campo tem flores
As flores tem mel, mas à noitinha
Estrelas no céu, no céu, no céu

O céu da boca da onça é escuro
Não cometa, não cometa, não cometa furo
Pimenta malagueta não é pimentão, tão, tão

Vou pro campo acampar no mato
No mato tem pato, gato, carrapato
Canto de cachoeira

Dentro d'água pedrinhas redondas
Quem não sabe nadar não caia nessa onda
Que a cachoeira é funda e afunda

Não sou tanajura, mas eu crio asas
Como os vaga-lumes eu quero voar, voar, voar
O céu estrelado hoje é minha casa
Fica mais bonita quanto tem luar, luar, luar

Quero acordar com os passarinhos
            Cantar uma canção com o sabiá       (BIS)

 

Dizem que verrugas são estrelas
Que a gente aponta, que a gente conta antes de dormir
Antes de dormir, dormir, dormir

Eu tenho contado, mas não tem nascido
Isso é histórias de nariz comprido
Deixe de mentir, mentir, mentir

Os sete anões são pequeninos
Sete corações de menino
De alma leve, leve, leve

São folhas e flores aos vento
O sorriso e o sentimento
Da branca de neve, neve, neve

Não sou tanajura, mas eu crio asas
Como os vaga-lumes eu quero voar, voar, voar
O céu estrelado hoje é minha casa
Fica mais bonita quanto tem luar, luar, luar

Quero acordar com os passarinhos
            Cantar uma canção com o sabiá       (BIS)




A Viagem e o Vestido
Teddy Williams

O vôo já estava confirmado. Quase 01h da manhã de uma sexta-feira e eles ali no saguão do aeroporto: um corpo aparentando tristeza, calado e os olhos escondidos por traz de uns óculos escuros. O que contrastava com a aparente tristeza era o lindo vestido que ele não se lembrava de ter dado a ela de presente. O sorriso estampado em seu rosto. Vestia camisa manga comprida listrada, calça social azul, sapatos marrons, combinando com o cinto. Era tanta alegria que ficava cego para os sentimentos da esposa.

Ela soube da viagem dele, por acaso, quando foi pagar as contas e encontrou um bilhete dobrado. Estavam lá: três parcelas de duzentos e cinquenta reais. Passagem aérea para São Paulo. Não perguntou nada. Apenas esperou. Poderia ser um presente para ela... Seria bom viajar, conhecer outros lugares. Pessoas bonitas, praias, comidas diferentes. Ajudaria na relação. Cinco anos passaram rápidos desde a última viagem para fora do estado, como presente de casamento. Foi tão maravilhoso!

Ele queria fazer uma surpresa para a mãe. Comprou as passagens e iria visitá-la, sozinho. Pensou que contando a esposa ela estragaria tudo, pois ligaria, daria um jeito para conversarem, mesmo que fosse para não dizer nada e a sogra saberia tirar dela tudo o que estava acontecendo. “Ela é tão ingênua – falava ele sempre quando se referia à esposa”. Ele, já com seus 35 anos e ela com 23, tinha a certeza da aprovação do seu casamento por parte da mãe, mas sempre perguntava se tinha sido uma boa escolha. Sempre encontrava as duas conversando, quase escondidas, mas conversavam e muito. Às vezes encontrava a esposa a chorar, mas não seria nada, sabia que a mãe a tratava como filha. Quando perguntava o que faziam as duas, elas nunca revelavam e ele sabia que era carinho de mãe. Ela ligava quase toda hora, mais para saber da nora do que do filho. Ele admirava aquela relação.

Outra chamada para o voo 171. Eles se abraçaram fortemente.

- Não chore minha querida, volto em quatro dias, só o tempo de assinar os documentos, passar tudo para eles e viajar de volta. Não se esqueça de pegar o taxi do aeroporto. Cuidado com os taxis piratas. Eu ligo quando chegar. Beijos!
- Tudo bem. Tomarei cuidado. Sempre tomo! Faça ótima viagem e resolva tudo! - ela o beijou e ele correu para o setor de embarque.

Ele desapareceu entre os agentes da Infraero e os outros passageiros e ela foi se afastando, lentamente, com o coração acelerado, pegar seu taxi. Bem distante dos taxis oficiais, falava ao telefone informando que já estava saindo do aeroporto e chegaria em 20 minutos. Assim foram: ar ligado, música suave e baixa, para uma rua em sentido oposto ao de seu apartamento.

O marido era o filho mais paparicado pela mãe, de todos os cinco. Único do segundo casamento, e o que melhor conseguiu se posicionar na vida, pois os outros nada fazem, a não ser gastar o dinheiro dos pais. Quando menor, nem brincava com outras crianças, se a mãe não estivesse por perto. Na juventude ela lhe regulava os passos: escolhia as namoradas, os amigos e proibia festas. Já trabalhando, adulto, independente, disse à mãe que iria casar. Foi a primeira briga com ela. Disse que não aceitava, ainda era novo, tudo isso pressionada pelos filhos, sempre interessados em seu dinheiro.

Conheceu a futura esposa do filho e logo se tornaram inimigas silenciosas. Era linda! Tranquila, inteligente e cheia de vida. Não daria certo, ela o manipularia, pensou. Fez de tudo para evitar o casamento. Agora faz de tudo para acabá-lo, silenciosamente. Se não fosse o gênio forte da nora, que por várias vezes disse ao marido as intenções de sua mãe, mesmo ele não acreditando, já estariam separados.

Várias vezes sua mãe liga, fazendo propostas para a separação. A esposa chorava nos primeiros anos, depois passou a deixar o telefone ligado e a sogra falando sozinha. Chorando necessidades para os filhos - todos maiores de idade e bem de saúde.

Todas às vezes que a esposa falava das conversas com a mãe, que não aceitava o casamento deles, o marido dizia que era implicância dela. Ela não entendia o sofrimento da mãe, para criar os coitados dos irmãos... – você é muito nova ainda, ele sempre dizia. Ela passou a se calar. Apenas sorria um sorriso distante.

O carro estacionou em frente a uma casa simples, em uma rua calma. O silêncio era quebrado apenas por cachorros latindo. No portão, ao lado de fora, um rapaz com seus 27 anos aproximadamente, com o peito nu, short, sandálias havaianas e sorrisos, esperava. Ela pagou a corrida. Desceu do carro saltando nos braços dele. Sem os óculos escuros. Com sorriso nos lábios e transformada em outra mulher.

- Como você está linda nesse vestido, já estou excitado para rever o que tem dentro.
- Também gostei muito do presente que você me deu. Quando me vi no espelho, só imaginei você me despindo, é tudo o que desejo.
- Entre! Seja bem vinda, tem um vinho e uma cama esperando por você.

E foram para outra viagem.

terça-feira, 17 de abril de 2012


A Última Chamada
Teddy Williams
Estava assim: cansado e ansioso. Uma nova jornada se iniciava.
Passara toda a manhã organizando sua primeira viagem do ano e essa seria para fora do estado. Na realidade já a estava organizando fazia 28 dias.
A manhã e a tarde foram corridos: aulas, reuniões, livros, discos, dvds e o carro do irmão que o deixara no aeroporto, já no fim da noite. Lá estava ele, antes de embarcar, bem depois do demorado chek in, morto de cansaço, uma hora adiantado no setor de embarque. No raio x passou o casaco, a aliança, a pulseira, sua mochila(com notebook, celulares e dvds), moedas e o inseparável violão.
Tudo em ordem! Pode passar, obrigado e boa viagem! - foi o que disseram.
Sentou-se, teria que esperar um pouco ainda antes do vôo ser anunciado. Estava marcado para as 22h. Antes das 01h da manhã já estaria em seu destino, no sul do país. Observou ao redor onde muitos também esperavam: uma criança sorria lindamente, um casal conversava, um bebê era alimentado por sua mãe, assistida por uma senhora, talvez a avó. Ao seu lado direito, olhou lenta e demoradamente, linda jovem com o notebook aberto em uma página sobre clima, estranhou, sabia que o tempo nesses dias estava bom em todo o Brasil. Sentiu seu perfume pelo ar e fechou os olhos por instantes. Em seguida, observou outro canto do salão de embarque, um grupo uniformizado conversava distraído fazendo barulho sobre o jogo da tarde.
Quando chamaram para o vôo quase todos se levantaram ao mesmo tempo, ele e ela resolveram continuar sentados – a fila ainda continuaria antes de entrarem no avião pensou consigo mesmo e fechou os olhos, sentindo novamente o perfume dela e adormecendo. Acordou assustado, coração acelerado, seu nome era chamado nos alto-falantes. Levantou-se e correu. Na correria do embarque havia esquecido o violão ao lado da cadeira na qual sentara. Imaginem vocês, um violão - sua mãe um dia disse: “não esquece a cabeça porque está em cima do corpo” e o violão bem ali a sua frente, fora do seu campo de visão, é claro, um erro em aeroportos. Voltou, sorriu e o pegou. Há tempos estavam juntos. Ambos se faziam companhia por essas viagens solitárias, às vezes. Chegou com o coração na boca próximo a porta de entrada do avião.
A sorridente aeromoça estava lhe esperando (na realidade todos estavam) e no ar o mesmo leve cheiro do perfume lhe voltou à memória. Ela lhe sorriu. Deu as boas vindas e desejou boa viagem. Ele continuou tentando encontrar aquela que vira ao seu lado, no salão de embarque, nas poltronas por onde passava. Mas não conseguiu.
Nos aeroportos dizem sempre que é a “última chamada”, chega a chatear: não quer entrar ou não pode, vai no próximo! Mas já deveriam o estar chamando fazia alguns minutos. Todos os olhares dos passageiros sentados lhe eram direcionados, quase em silêncio. Uma criança chorava compulsivamente. Ele sorriu para a criança, passando-lhe a mão por sobre os cabelos e ela foi silenciando, parando pouco a pouco – coincidência, ele pensou, feliz coincidência, pois o choro da criança o havia assustado logo na entrada em meio ao quase silêncio geral, ele agradeceu em uma prece.
Foi procurando a sua poltrona e logo a encontrou. Dois lugares vagos, 26d e 26e, as únicas poltronas vagas, de duas filas triplas e a sua era a “d”, no corredor. Sentou-se e sentiu-se mais calmo, assustara-se também com o ocorrido, ter dormido minutos antes de viajar. Para ele perder esse vôo seria desastroso. Acreditava que todo o seu trabalho estaria ligado àquela viagem, pensou como sempre pensava: o trabalho mais importante de todo o resto da vida.
Cintos apertados! Poltronas na posição vertical! O piloto dá as boas vindas, informando do fechamento das portas. Avião taxiando, informações de emergência e as luzes que não deixam a gente dormir. Lá iam todos! Força! Força! Pensava com os braços presos junto à cadeira. Pés firmes no chão, olhos cerrados e a sensação de estar subindo. Nesse instante os olhos pesaram, pesaram e se fecharam. Acordou com o comandante informando sobre o bom tempo na região e da hora que chegariam ao destino, às 00:37minutos. O lanche estava sendo servido. Observou na poltrona 26e, ao seu lado direito, a mesma linda jovem que estava com o notebook aberto no salão do aeroporto, havia pensado que era o último a ter entrado – talvez ela devesse ter ido ao banheiro, porém não a sentiu passando por seu lado para sentar-se. Teria ele levantado ainda dormindo? Ela sorriu, olhou para a janela vizinha e disse, com um timbre de voz quase recentemente escutada, tentou lembrar onde, ouvindo as palavras da sorridente vizinha:
- Uma grande tempestade está se aproximando, será uma dura experiência em nossas vidas, mas não tenha medo, tudo dará certo!
Observou seus olhos, sua pele, seus lábios. Seria uma boa oportunidade para conversarem e foi ela quem iniciou pensou dirigindo-se baixinho para falar-lhe:
- O piloto não havia falado em tempo bom em todo o percurso e vôo tranqüilo????... ficou sem respostas... Ela estava com um livro aberto “A Menina que Roubava Livros”, o corpo profundamente imerso na leitura. Sorriu sem jeito e virou-se, voltando a fechar os olhos e a dormir. Teve medo, muito medo, ela era tão tranqüilamente linda: voz, olhar, sorriso e até a pele. Ele lembrou-se da criança que não mais chorava, para tranqüilizar-se novamente.
Acordou com as luzes de emergências piscando: muito barulho, choros, gritos de criança, jovens, adultos e o avião tremulando, uma voz orientando nervosamente para que todos abaixassem a cabeça junto aos joelhos e tudo isso ele fez. Algumas coisas já estavam caindo dos compartimentos de bagagens e os gritos continuavam. Um terror dominou aquele vôo e não se podia fazer nada, ele novamente fez uma prece!
Foram poucos segundos, porém pareceram eternos, como dizem sempre. Aos poucos as coisas foram se acalmando. Os gritos e choros continuavam. O coração ainda acelerado. O avião estava estabilizado. As luzes acesas e o piloto informando que haviam passado por uma tempestade que não estava em nenhum registro. Faria um pouso de emergência para socorrer aos feridos e ver possíveis avarias. Algumas pessoas precisariam de socorro médico, muitas malas caíram sobre os passageiros. O violão estava ali, no chão quebrado. Ia comentar isso com a vizinha, antes ajeitou o relógio em seu pulso, era 00:02 minutos, virou-se para sua direita e não viu ninguém, entre ele e o passageiro da poltrona 26f, da janela por onde ela havia olhado, lá estava só uma cadeira vazia. Os pelos ficaram levemente arrepiados e o coração disparou simplesmente. Abriu e fechou os olhos três vezes, procurou depois pelo chão ao seu redor e nada.
As aeromoças, a cada poltrona, ajudavam aos mais feridos e pediam auxilio aos que estavam bem. Assim foram colocando no lugar as coisas que haviam caído. Ele chamou a que lhe dera as boas vindas e perguntou pela passageira da poltrona 26e. Ela olhou para ele e o seu vizinho do 26f e respondeu que ela fora a única passageira que não tinha embarcado, ele tinha sido o último, dos dois que esperavam. Perguntou se ambos estavam bem e continuou fechando os compartimentos abertos. Pegou no chão, no corredor ao seu lado esquerdo, um pedaço de papel e o entregou a ele que instintivamente o segurou e com dificuldades leu, pelo cabeçalho reconheceu ser uma página do A Menina que Roubava Livros, mas o livro e nem a menina foram encontrados quando os procurou.
O pouso no aeroporto mais próximo fora muito tenso: bombeiros, ambulâncias, todo o aparato de socorro mobilizado. Quando o avião aterrissou as portas de emergências foram acionadas e os procedimentos de atendimento aos feridos foram realizados. Conversando, no setor reservado aos feridos, sendo atendidos por médicos e enfermeiras, ouviu falar de alguns mortos e outros gravemente feridos. Uma tristeza se generalizou, todos se calaram.
Ouviu a palavra fatalidade e a expressão triste experiência. Com certeza foi uma dura experiência para todos. O cheiro do perfume e o som daquela voz ainda estão na sua memória, marcados para sempre.

Ensaios para um acidente menor
   Teddy Williams

Depois de um belo domingo na praia, entre Recreio e Barra, com  parentes e amigos, tive que me obrigar a uma noite de descanso por causa do sol, preparando a voz para as histórias do dia seguinte.

Acordei para uma segunda-feira maravilhosa: depois de uma hora e meia de viagem subi uma imensa ladeira, perto de Copacabana e tive o prazer de poder contar histórias para crianças em uma creche na Ladeira dos Tabajaras. Em seguida apresentei uma parte do meu trabalho e falei do projeto Ciranda das Coisas do Coração para novos amigos em uma reunião de projetos sociais e contei uma história para os presentes o que também me agradou muito.

O ano começou maravilhoso. Hoje faz um mês que estou reencontrando as minhas raízes no Rio de Janeiro e espero ainda poder ir a Minas Gerais. Aqui estou revendo a família, amigos, as ruas por onde andei quando tinha menos de quinze anos, a escola onde comecei o Bê A  BÁ. Tudo isso e um pouco mais estão marcando esses dias. Fora as novas amizades que estão sendo construídas.

Nesse dia 17 de janeiro, muito contente com as novas conquista: uma reeducação alimentar iniciada, exercícios frequentes, menos oito kilos no corpo e no mínimo já faz mais de um mês que não bebo, o que para mim tem sido maravilhoso. Bebemoro e comemoro de outras formas.

Estava em casa(dos meus primos aqui em Madureira, da canção do Zeca Baleiro ”Quem não ode Nova York vai de Madureira”), facebookando, quando meu primo liga e pede para que a tarde, quando eu fosse dar uma volta de bicicleta, aproveitasse e calibrasse os pneus da mesma. Tranquilo eu falei, faço sim.  Esperei chegar a tardinha e por volta das 18h aqui do horário de verão, saí e fui pedalando até um posto para calibragem dos pneus. Lá as coisas desandaram: o pneu da frente, ao invés de encher ficou mais vazio ainda. Tentei, tentei e nada. Resolvi continuar a caminhada empurrando a bicicleta e o fiz por mais de 45 minutos até poder voltar ao mesmo posto e tentar novamente.

Depois de uns minutos de sofrimento, com a ajuda de outro ciclista, o pneu foi calibrado e então pé na estrada.

Alegre pelo feito pedalava e o fazia por ruas tranquilas, quando o celular toca, eu atendo e me perguntam o que eu estava fazendo e respondi, com alegria, que pedalava. Segundos depois não pedalava mais, havia caído, logo após uma lombada, cena triste e cômica.

Saldo para o tal mês de férias: uma pontinha de um dente quebrado, braço e perna esquerdos ralados, relógio quebrado e celular espatifado, porém alegre, pois um mês de férias não pode passar em branco e é lógico, feliz e graças à Deus estou bem, nada de celular ao volante, de agora em diante, caso precise, eu dou sinal, vou para o acostamento e paro. Para poder seguir depois tranquilo.


“O Lobo” de Clarice Lispector

"...Pois logo a mim, tão cheia de garras e sonhos,
coubera arrancar de seu coração a flecha farpada.
De chofre explicava-se para que eu nascera com mão dura,
que eu nascera sem nojo da dor.
- Para que te servem essas unhas longas?
- Para te arranhar de morte e para arrancar os teus espinhos mortais,
responde o lobo do homem.
- Para que te serve essa cruel boca de fome?
- Para te morder e para soprar a fim de que eu não te doa demais, meu amor,
já que tenho que te doer, eu sou o lobo inevitável pois a vida me foi dada.
- Para que te servem essas mãos que ardem e prendem
- Para ficarmos de mãos dadas, pois preciso tanto, tanto, tanto

Uivaram os lobos e olharam intimidados as próprias garras
antes de se aconchegarem um no outro para amar e dormir